domingo, 22 de julho de 2012

Terá o Euro realmente retirado competitividade à Economia Portuguesa

São diversos os comentadores e economistas que defendem que o Euro retirou competitividade à nossa economia. Assim, defendem que a economia portuguesa não tem capacidade para estar num sistema de câmbios fixos e desse modo, a solução para readquirirmos competitividade seria o regresso ao escudo.

Em que é que se baseiam este grupo de pessoas?

 Evolução da Balança Corrente











Antes de mais, quais as variáveis que inclui a Balança Corrente?

B. Corrente = B. Bens e serviços (exportações - importações) + B. Rendimentos (pouco significativa no caso português) + B. Transferências (ex: remessas de imigrantes).

Sendo a B. Bens e serviços, a componente fundamental da mesma, esta no fundo é resultado do valor da importações e das exportações. Olhando para os dados anteriores, somos automaticamente tentados a dizer que, de facto, a economia portuguesa tem perdido competitividade. Mas estará isto correcto? Como se mede realmente a competitividade? Esta deve ser vista sempre pelo lado da variação das exportações. Uma vez que a Balança Corrente também incorpora o efeito das importações, não serve como medida adequada de competirividade.

Olhemos então para o que se tem passado do lado das exportações...
















Assim, estamos em condições de analisar, efectivamente, a evolução da competitividade dos produtos nacionais. Observamos, a partir da análise do gráfico, que a partir de 2002 e até 2005 registam-se taxas de crescimento das exportações inferiores às do período pré-euro. Quererá isto dizer, automaticamente, que o euro condicionou a nossa competitividade? Não, de todo. Temos de ter em conta que neste período entraram em cena no mercado internacional, países asiáticos como a China, cuja estrutura de exportações assenta em produtos de baixa tecnologia, ou seja, de mão-de-obra intensiva. Será que estes países afectaram a posição internacional de Portugal? Para respondermos a isto, observemos a estrutura de exportações nacionais no período pré-euro.



Assim, olhando para estes dados, verificamos que antes da adesão ao euro, a economia portuguesa tinha uma estrutura claramente assente em produtos de mão-de-obra intensiva, tal como estes países que entraram em cena nos mercados internacionais. A questão fundamental é a seguinte: seria possível num sistema de câmbios flexíveis responder a esta nova concorrência? Não me parece, uma vez que o salário mínimo chinês ( por exemplo) é muito inferior ao português (para termos uma noção, na zona mais rica da China, Xangai, existiu um aumento para 177 euros, em contraste com os 485 euros nacionais. No entanto, na maioria dos estados chineses estes valores são muito inferiores a 177 euros. Para além disso, o número de horas de trabalho na China é bem superior). Assim, para chegarmos a estes patamares seria necessário uma fortíssima desvalorização da moeda, que seria totalmente incomportável, uma vez que geraria na economia portuguesa um elevado processo inflacionário, com graves consequências. Para além disso, este processo inflacionário reverteria em parte os efeitos da desvalorização da moeda, já que a inflação corresponde a um agravamento dos preços. 

Assim, neste caso, os câmbios flexíveis não reverteriam estes efeitos. Que tipo de ajustamento deve existir?

Deverá haver um novo padrão de especialização da economia nacional, assente em produtos de maior incorporação tecnológica (não quero dizer com isto, que o caminho é a alta tecnologia). Será que a economia portuguesa tem caminhado nesse sentido?


Olhando, para a estrutura de exportações após a adesão ao euro, vemos que o peso dos produtos de baixa tecnologia diminuiu expressivamente, tendo os restantes tipos de produtos ganho peso na estrutura de exportações, com especial destaque para os de alta tecnologia. Ou seja, a economia portuguesa tem-se ajustado gradualmente. 

A questão final é a seguinte: tem tido este ajustamento resultados?

Recuperando o gráfico da variação das exportações, observamos que a partir de 2006 as exportações têm registado uma nova dinâmica, sendo este ano o de maior crescimento dos últimos 22 anos. Em 2007 manteve-se esta tendência de forte crescimento que só foi revertida em 2008 e 2009, devido à crise do subprime. Em 2010 e 2011 regressaram as fortes taxas de crescimento das exportações, ao nível das melhores que se registaram nos anos 90.

Conclusão

Assim, conclui-se que de forma alguma o euro é a causa da suposta perda de competitividade nacional. Esta foi fruto de um novo contexto internacional, ao qual Portugal nunca poderia reagir com medidas de desvalorização cambial (mesmo que estivesse num regime de câmbios flexíveis). Assim, o ajustamento deve (como tem vindo a acontecer) ser efectuado via estrutura exportadora, o que tem tido sucessos assinaláveis.

6 comentários:

  1. Parabéns pelo blog e pela "audácia" das posições, com as quais contudo não concordo. E não concordo porque não me parece ser "de forma alguma" possível tomar conclusões tão taxativas. A meu ver a questão não é tanto saber se o euro é ou não a causa da perda de competitividade mas antes saber de que forma é que o euro contribuiu ou não para a criação de desequilibrios a nível externo e se contribuiu ou não para a adaptação (ou se preferir ajustamento) da economia portuguesa.

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  2. Quando afirmo o que digo, não acho de forma alguma dono da verdade. Agora os dados por vezes dão-nos indicações muito claras como me parece ser o caso. E o que se oberva é que há uma indicação clara de que Portugal, dado o actual contexto internacional tem claras dificuldades em competir via custos. Assim, mesmo que estivesse num regime de câmbios flexíveis, a situação não seria muito distinta. Observa-se é que a partir do momento em que a estrutura exportadora se começa a ajustar (ou seja, a partir de 2004), dois anos depois vemos que atingimos taxas de crescimento das exportações elevadas (por exemplo em 2006 que foi a maior dos ultimos 22 anos). É de realçar que no inicio dos anos 90 estavamos no período inicial de adesão à CEE, o que reforça ainda mais a grandeza dos resultados. Esta tendência de crescimento das exportações tem sido continua (excepto nos anos da crise do subprime), o que na minha opinião mostra que a economia portuguesa não perdeu competitividade no euro,pois soube-se adaptar ao novo contexto internacional.
    Quando diz que o euro pode ter contribuido para o desequilibrios externos, isso deriva do facto de com a entrada no mesmo beneficiarmos de taxas de juro muito baixos, o que incentivou grandemente o consumo improdutivo. Na minha opinião, o euro foi uma oportunidade perdida, já que não soubemos explorar as vantagens do mesmo

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  3. Antes de mais parabéns pelo blog, gostei dos textos e revejo-me na maior parte das conclusões. Segundo qualquer economista que diga que uma moeda degrada ou estimula a economia de um país de economia percebe 0. É verdade que no curto prazo pode existir um efeito mas que no médio prazo já se encontra dissipado. Além do mais a desvalorização da moeda é a "arma dos fracos".

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  4. Como é obvio a entrada no Euro prejudicou a nossa economia como sr vê pela evolucao da BTC !

    Dada a elevada propensao para importações uma meda forte ajuda a aumentar essa tendência .

    As nossas empresas exportadoras concorrem muito com as da Ásia que mantiveram moedas fracas, dai o fraco aumento das exportações nos últimos 10 anos .

    O problema maior foi a enorme valorização do Euro face ao dólar . apenas quebrada nos últimos meses !

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    1. Antes de mais, obrigado pela sua participação e espero que continue a "espreitar" e a comentar o blog.

      Relativamente ao que disse:

      A nossa entrada no euro não me parece que tenha prejudicado a nossa economia. O que aconteceu foi que nós não soubemos aproveitar as possíveis vantagens, nomeadamente o baixar das taxas de juro. Este instrumento foi usado para aumentar desenfreadamente o consumo improdutivo, ao invés de se financiar sectores da actividade económica, que seriam fundamentais num novo contexto internacional em que estava inserida a nossa economia, que tem fundamentalmente a ver com o surgimento na cena internacional de países como a China. Mesmo num contexto de câmbios flexíveis muito dificilmente poderiamos competir com esses países. Quando diz que a enorme valorização do Euro foi um problema, admito que tenha tido algum efeito, mas muito ténue, já que tirando os anos da crise do subprime, as nossas exportações após 2005 registaram aumentos muito interessantes. Logo não é empiricamente possível estabelecer uma ligação entre essas 2 variáveis.

      Para terminar, a Balança Corrente deteriorou porque me parece que se recorreu a um endividamento excessivo, fruto de um grande consumismo. Tal pode facilmente ser constatado, com o equilibrio da mesma balança, através das medidas de austeridade, o que só demonstra que este desequilibrio foi fruto de um mau uso dos bons instrumentos do euro (nomeadamente taxa de juro).

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  5. Caro amigo...
    Não sendo eu economista, nem tão pouco ligado à gestão, sou no entanto um cidadão informado, e apesar de a minha percepção da verdade dos factos da nossa economia e da sua evolução ser construída com base em memórias de artigos que vou lendo aqui e ali, por vezes com base em gráficos do INE e por aí adiante, e acima de tudo com aquele "sexto sentido" de cidadão comum que vai sentindo o "pulsar" da sociedade, este seu artigo só vem corroborar a ideia que eu tinha da governação...
    Pelo que me apercebo dos gráficos, as exportações portuguesas, ou seja, as empresas e os empresários procuraram dar resposta às dificuldades fazendo um "shifting" na produção.
    Como estas coisas não acontecem de um dia para o outro, mas vão tendo resultados graduais, parece-me que os governos que apostaram fortemente na qualificação foram aqueles que mais acertaram na estratégia.
    Por outro lado, também se deve reconhecer que o endividamento excessivo da fazenda pública foi de certo modo uma forma de camuflar a capacidade dos sucessivos governos em fazer o necessário "shifting" em termos de estratégias produtivas para o país, nomeadamente os investimentos clássicos em obras públicas não produtivas, como os estádios, as fontes, os embelezamentos das cidades, que são muito bonitos por um tempo, mas que sem a necessária estratégia económica de viabilidade, tornam-se elefantes (negros).
    Associado a isto, o endividamento privado acabou por tornar Portugal num "alvo perfeito" para a estratégia de especulação de juros que se iniciou a seguir ao "subprime"... Como se costuma dizer... "Pusemos-nos a jeito!"
    Sem dúvida, que agora, a política de austeridade iria forçosamente equilibrar as contas, já que as importações caíram, como seria de esperar, sem que desta vez essa queda fosse também acompanhada da queda das exportações.. portanto, os portugueses de uma forma genérica adaptam-se rapidamente às circunstâncias, mas aparentemente, os governos têm mais dificuldade em delinear estratégias duradouras para que a adaptação seja consistente e que alinhe esforços com as empresas e os cidadãos...
    Será que não precisamos de mais estratégia para além da austeridade???

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