sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Um financiamento alternativo para a TSU


A medida que o Governo apresentou para  a mexida na TSU, como referi no post anterior parecia-me totalmente errada, na medida em que deprimia ainda mais a procura interna. Assim, caso se queira mexer na TSU, que admito possa ter alguns efeitos positivos ao nível das exportações, deve-se tentar encontrar um pacote de medidas, que permita reduzir os custos do trabalho, induzindo assim maior competitividade custo.

Quais as prioridades de uma medida a este nível:

  • Impacto orçamental nulo;
  • Não deprimir o mercado interno e as expectativas dos agentes;
  • Induzir maior competitividade

Assim , como se vê a medida que o Governo apresentava,   provavelmente não teria um impacto orçamental nulo, na medida em que iria aumentar o ciclo recessivo.

Assim, analisemos algumas das possíveis medidas…

1- Retirada da TSU para as empresas que criem emprego líquido

Esta medida apresentada no relatório realizado pelo Banco de Portugal no ano passado, admite a retirada da TSU sobre os novos postos de trabalho criados, não incidindo sobre os trabalhadores já existentes.  Esta medida apresenta algumas vantagens face à apresentada pelo Governo, já que tem um custo relativamente baixo (cerca de 480 milhões de euros, ver abaixo), permite adquirir maior competitividade, para além de não deprimir o mercado interno.










Contudo, não me parece uma solução perfeita, e nem sequer a melhor …

Esta medida só incide sobre as empresas que criam emprego, ou seja, principalmente as exportadoras. É verdade que isso é fundamental, contudo devemos salientar que seria importante também ajudar, em parte, o mercado interno para tentar proteger postos de trabalho dando maior folga de tesouraria  às empresas. É de salientar, também, que mesmo para as exportadoras, esta medida também pode ter poucos efeitos, já que a instabilidade internacional a que se assiste, faz com que  haja um impacto negativo nas exportações , e faz com que as necessidades de contratação baixem bastante, o que não induz assim a maior competitividade. Uma medida que incidisse sobre a totalidade dos trabalhadores, seria mais eficaz, já que permitiria imediatamente uma possível redução de custos das empresas.

A questão que se coloca agora é a seguinte: haverá uma medida que consiga conciliar os aspectos fundamentais que referi no início, e que contorne os problemas que citei anteriormente?

Assim, parece-me que a solução poderá ser a criação de um sistema de TSU variável à semelhança do que acontece noutros países (como a França e a Alemanha). A lógica seria diminuir a TSU drasticamente (por exemplo 5%, 6%) para os salários até um determinado tecto (por exemplo 700 euros),  em contrapartida de um aumento também ele significativo em salários mais elevados. Claro que neste momento não tenho possibilidade de indicar valores que permitam manter uma certa neutralidade orçamental da medida. Ainda assim, posso enquadrar a actual TSU que temos no contexto da EU, para termos ideia dos valores que poderemos estar a falar:
















Mas ainda existe uma interrogação importante...Esta forma de financiamento é realmente possível?
Para responder a isto, basta recorrermos a uma pequena estatística que passo a apresentar:
Assim, vê-se com clareza, que  as remunerações superiores a 1000 euros têm um peso de cerca de 30%. Se baixarmos para a zona dos 700/800 euros vemos que a margem ainda será superior, e aliado a isso o sistema que admito tem um carácter progressivo, pelo que a questão do financiamento não é um problema.
Adicionado a isto...
Esta medida tem vantagens óbvias:
1 - Permite na mesma que os sectores mais beneficiados são os exportadores




Como se vê, os sectores que têm uma elevada quota de exportação (por exemplo, o sector têxtil) têm um nível salarial baixo, pelo que certamente esta medida ajudaria a adquirirem alguma competitividade custo.

2 - Ajuda alguns dos sectores mais afectados pela crise


Como é o caso do sector da construção e da restauração, que têm sido muito afectados pela crise, pelo que esta medida pode garantir a sobrevivência de alguns postos de trabalho, versatilidade que a medida da criação líquida de emprego não tem.

3 - Os sectores mais protegidos da concorrência internamente são os que mais financiam proporcionalmente esta medida

Olhando para o quadro anterior, o sector das telecomunicações, da electricidade e dos combustíveis são aqueles que apresentam níveis salariais mais elevados,  pelo que esta medida teria o efeito de fazer com que estas arcassem com um certo financiamento desta medida.

Conclusão

Tenho noção da dúvida que existe sobre os possíveis efeitos desta medida, contudo penso que num cenário de certa incerteza, entrar em medidas que prejudiquem a procura podem ser prejudiciais. Assim, optando por este cenário (menos dispendioso, perigoso) pode-se arriscar numa solução deste tipo, e esperar que a mesma tenha alguns efeitos.

14 comentários:

  1. Ricardo, os meus sinceros parabéns pelo trabalho promissor que tem vindo a desenvolver.

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  2. A análise está bem feita mas, e digo isto com todo o respeito, parte de uma premissa completamente errada. Não atende efectivamente à natureza e diversidade das taxas contributivas. Não se pode usar um critério de escalões de remunerações na taxa contributiva da Segurança Social, dado que a mesma está construida sob o critério do tipo de actividade do contribuinte. Aconselho a observar a tabela de taxas para compreender o raciocínio.
    Obrigado.

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  3. Caro MBJ penso que se está a referir ao facto de existirem diversas taxas por actividade profissional ( que configuram no sistema português uma excepção). Ou seja, a lei estabelece um conjunto de excepções. Contudo, a taxa geral (e única) que funciona para grande maioria dos trabalhadores portugueses é a taxa de 23,75%. Assim, a minha proposta incide sobre esta taxa geral aplicada à maioria dos trabalhadores. As excepções que a lei prevê deverão ser mantidas ou então nestas criar também um regime variável. No entanto, falando em termos gerais que é mais importante, defendo um regime variável, em função dos rendimentos, e penso que isso é totalmente possível.
    Peço desculpa apesar de tudo por não ter frisado esse facto, mas o fundamental é reter a forma de financiamento que refiro para a TSU (através da variabilidade das taxas). Esses escalões excepcionais que fala, deverão também necessariamente ser enquadrados nessa nova lógica.

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  4. Caro MBJ, posso-lhe assegurar que a TSU de 23,75% aplica-se a cerca de 75% dos trabalhadores, sendo que os restantes 25% têm taxas inferiores.

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  5. Ora bem. Pelo que tenho lido por aí, mexidas na TSU são essencialmente medidas de calibragem macroeconómica. Qual a diferença(s)/(des)vantagens entre desvalorização fiscal e desvalorização cambial?
    Em termos gerais quais as diferença(s)-i.e. os pontos genérico(s)-entre a proposta do governo e a proposta do BdP?

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  6. Essa taxa geral aplicada só diz respeito à contribuição das entidades empregadoras, mesmo abrangendo três quartos dos trabalhadores. Sucede que, a aplicar-se a diferenciação no que concerne a valores de remuneração, está-se a criar um sistema de progressividade que não é próprio da Segurança Social, mas sim dos impostos sobre o rendimento, mormente IRS. Na minha opinião é uma adulteração do sistema, adulteração essa que cria problemas de construção dogmática, dado que a Segurança Social não foi criada com o mesmo objectivo de um imposto sobre o rendimento, nem tem a mesma natureza.

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    1. Caro MBJ, peço desculpa mas discordo da sua análise. Repare a própria França muitas vezes apontada como a casa-mãe do estado social, tem um regime variável. A própria segurança social tem um carácter social e de ajuda, pelo que não me choca nada um regime em que contratar pessoas bem remuneradas tenha custos proporcionalmente superiores. Não me parece de todo justo, que por exemplo, um alto quadro de uma empresa, que ganha milhares e milhares de euros, o patrão tenha a mesma taxa de esforço quando comparado com um simples funcionário pouco remunerado. Não quero com isto desvalorizar o esforço de quem estudou bastante e tem grandes competências, mas simplesmente tem de haver uma certa equidade na sociedade, pelo que esta medida também ajuda a isso. Para além disso, quer queiramos quer não no curto prazo, Portugal pode ganhar apenas uma embalagem extra em termos internacionais via custos, pelo que esta me parece a melhor solução.

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  7. Antes de se proceder a um «Estudo Económico-Financeiro», a grande questão a colocar não será tentar perceber porque quer o governo aumentar a Taxa Social Única em 7%. Ou tomar uma medida similar?

    Há uns anos, começámos a ouvir falar do volume excessivo da dívida pública (que hoje rondará os 124% do PIB) e disseram-nos que precisávamos de a pagar urgentemente. Devíamos dinheiro a bancos estrangeiros e, como precisávamos de pedir mais dinheiro para as despesas correntes, não podíamos correr o risco de falhar uma prestação dos empréstimos anteriores. Tínhamos vivido acima das nossas possibilidades, disseram-nos.

    Mas que dívida é esta? Para começar, quanto devemos exactamente e a quem? Alguém já viu a lista das dívidas? Quem a certificou? Quem a auditou? Quem são os credores? E devemos de quê? O que comprámos? O que pedimos emprestado? Em que condições? Quando? Quem pediu? Quem recebeu? Onde e quando? Para onde entrou o dinheiro? Para que serviu? Alguém saberá alguma coisa verdadeira sobre a dívida? Na verdade, deveremos alguma coisa?

    Não é infinitamente mais importante começar por responder a estas questões?

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  8. Caro Diogo, subscrevo as suas preocupações, contudo também deve ter em conta que a sustentabilidade da nossa dívida depende em parte substancial do crescimento que a economia portuguesa terá nos próximos anos. A TSU surgiu a discussão como uma forma de promover a nossa competitividade. Assim, também é fundamental analisar os possíveis efeitos deste mecanismo, e propor (caso assim o entendamos) medidas alternativas. Não se esqueça que a dívida se mede em %do PIB, e o seu aumento explosivo também tem parte da explicação na sua evolução fortemente negativa. Assim, reduzir a questão apenas a quem, como e porque nos endividamos, é algo que em nada contribuirá para a nossa sustentabilidade económica. O fundamental é o crescimento, e sem crescimento não chegaremos a uma dívida sustentável.
    Outra questão importante é que a dívida privada até tem tido um comportamento muito mais negativo do que a pública, ou seja, reduzir a questão meramente à parte política é algo redutor.

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  9. Concordo com o Ricardo neste último comentário. De facto, estar a pensar no como, quando e onde é quase perda de tempo neste momento. Não é que não seja uma questão importante, mas chegar ao ponto de questionar se realmente a dívida existe, acho que aí é querer chegar ao ridículo. Portugal tem um conjunto de problemas que afetam o seu futuro. Pensar na origem dos mesmos é importante de um ponto de vista preventivo, mas nada adianta em termos de futuro. Se alguém quiser saber de onde surgiu este problema todo, ligue a tv na sic notícias ou tvi24 e ouça aqueles "debates". A essa questão chamo "chover no molhado"

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  10. Caro Ricardo (e Diogo Ferreira),

    Este diálogo parece quase surrealista.

    Portanto, não interessa donde vem a dívida, quem foram os corruptos que a negociaram (para PPPs, Estádios, etc.), quem foram os bancos (com políticos, legisladores e comentadores a soldo) que as forçaram, etc., etc., etc…

    Se eu tiver um advogado corrupto a quem nomeio como meu procurador e que, conluiado com aldrabão amigo dele, me compra um terreno por mil que vale apenas dez, esse contrato é válido?

    Estamos todos parvos?

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  11. Caro Diogo,

    Como deves poder ver, eu disse que as questões eram importantes em termos preventivos, isto é, para garantir que no futuro não caímos nos mesmos erros. Mas isso no presente não é prioritário visto que não resolve nada. Se isto fosse um país em condições, teríamos responsabilização das pessoas que nos trouxeram a esse fosso. E aí apoiar-te-ia na questão de tentar perceber de onde é que isto aparece. Mas como aqui são todos intocáveis, penso que há coisas mais importantes para resolver para já.

    Quanto às PPP, elas terão de ser renegociadas visto que os encargos para o Estado são inconportáveis. Os estádios e tudo o mais já não há nada a fazer. Ou se impede antes do erro ser cometido, ou então já não se faz nada. Se o TGV tivesse arrancado, estaria a ser construído neste momento porque já ninguém ia ter capacidade para parar a obra. Felizmente parou-se essa megalomania a tempo. O mesmo para o novo aeroporto.

    Um pequeno pensamento final... Não, não estamos todos parvos. Estivemos adormecidos durante décadas, somamos erros atrás de erros. Aliás, três intervenções do FMI em menos de 40 anos de democracia, é de mestre.

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  12. Caro Diogo Ferreira,

    Um contrato ferido de ilicitude é nulo. Portanto há tudo a fazer em relação às PPPs, aos empréstimos agiotas ao Estado Português, etc.

    E em relação aos corruptos que nos governos, na elaboração e aprovação das leis e aos juízes que nos tribunais deram o seu agreement a esta roubalheira descomunal, colocá-los a todos em tribunais a sério, supervisionados diretamente pela população.

    Você devia ver o vídeo do Prof. Paulo Morais sobre este assunto.

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  13. Caro Diogo,

    Será possível deixares-nos um link para podermos visualizar o vídeo em questão?
    Quanto à supervisão direta dos tribunais pelo povo, concordo, se bem que neste momento iria conduzir a julgamentos completamente tendenciosos, dado o sentimento de revolta da população.
    Mas sim, tal como Adam Smith afirmou na Riqueza das Nações, o Estado deve garantir a existência e bom funcionamento de um sistema de justiça, algo que em Portugal não acontece...

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